Guaiamuns Gigantes: faturando milhões de Pernambuco para o mundo

Em Pernambuco, fortes empresas de tecnologia, como a Procenge, nasceram antes mesmo do Porto Digital. Foto: divulgação

As pernambucanas Procenge, Serttel, Avantia, Neurotech e In Loco têm em comum muito mais do que uma inovação que virou um bom negócio. Além de faturarem milhões de reais por ano, elas compartilham da experiência de ter crescido para além das fronteiras do Estado e até do Brasil. Mas obter sucesso nos negócios, ainda mais quando se propõe a ser pioneiro em algo, requer esforço, planejamento, tempo e resiliência: elas enfrentaram crises político-econômicas e preconceito com a tecnologia vinda do Nordeste, principalmente as que viveram tempos anteriores ao Porto Digital.

Mais antiga empresa em atividade no parque tecnológico pernambucano, a Procenge começou em 1972 como um serviço derivado da Astep Consultoria, voltada para solução da malha viária do País — uma história que você pode conferir neste link, em uma outra matéria aqui do Memória do Futuro com o atual CEO, José Cláudio Oliveira, o Zé Cláudio, um dos fundadores da Procenge. 

José Cláudio Oliveira, o Zé Cláudio, é um dos fundadores da Procenge. Foto: Facebook Procenge

Forte no mercado local de tecnologia, a Procenge foi a responsável pela criação dos sistemas de transferência bancária, como o TED (Transferência Eletrônica Disponível) e DOC (Documento de Ordem de Crédito), hoje usados pelas grandes instituições financeiras do País. José Cláudio relata que a empresa vem resistindo a instabilidades internas e externas; desde o enxugamento dos sócios (eram 21 e ficaram sete) até as fortes crises econômicas que o País tem sofrido. Uma dificuldade, entretanto, não tinha a ver com o negócio:

“Nos estados do Sudeste e Sul as pessoas achavam que a gente era comedor de calango e só tinha Carnaval, praia e mulher bonita, mas não tecnologia”, conta José Cláudio.

Mas mesmo após tantos desafios, a Procenge se consolidou e hoje atua, prioritariamente, no ramo de desenvolvimento de sistemas de gestão e consultoria. Sua missão, segundo a apresentação em seu site, é “revolucionar o modo como as organizações utilizam a tecnologia da informação para transformar seus negócios”. Com essa premissa, a empresa hoje conta com um faturamento anual de R$ 30 milhões e planeja investir cada vez mais na capacitação de seus funcionários.


“Uma empresa como a nossa só sobrevive se estiver próxima do cliente, entendendo suas demandas. Para isso, temos que trabalhar permanentemente o pessoal da universidade, eles precisam aprender a usar a tecnologia em prol das suas áreas de conhecimento. Nossa atividade é feita por pessoas , tecnologia e máquinas são acessórios”, pontua Zé Claúdio.

Startup entre as gigantes

E por falar em universidade, foi de lá que saiu a empresa que se encaminha para ser o primeiro unicórnio (startup avaliada em mais de US$ 1 bilhão) pernambucano, a In Loco. Criada em 2014 por um grupo de universitários que cursava Ciência da Computação no CIn (Centro de Informática) da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), a empresa é fruto de um projeto iniciado em 2011. A ideia do grupo era transformar inteligência de localização em soluções de negócios para marcas e apps. A estratégia vem dando certo. Hoje a In Loco processa mais de 16 terabytes de dados de localização por dia, com audiência de 60 milhões de consumidores no Brasil.

 “A empresa que dominar a autenticação na internet das coisas vai capturar uma oportunidade de mercado maior que o Android capturou no mercado… E a gente quer estar nessa briga”, conta André Ferraz, CEO da In Loco.

Em junho de 2019, a startup pernambucana recebeu um aporte de US$ 20 milhões dos fundos Unbox Capital e Valor Capital. Crescendo, em apenas cinco anos, a In Loco já conta com um um time de mais de 200 pessoas e escritórios em Recife, São Paulo e Rio de Janeiro. Já em 2018 a startup teve um faturamento de R$ 50 milhões, e hoje segue com uma taxa de crescimento de 100%. De acordo com o cofundador e CEO da empresa, André Ferraz, tamanho sucesso é fruto de muita persistência dele e dos seus sócios Alan Gomes, Denysson Messias, Airton Sampaio, Gabriel Falcone, Lucas Queiroz.

cofundador e CEO da empresa, André Ferraz, diz que o sucesso é fruto de muita persistência. Foto: divulgação

Jovens, eles se depararam com desconfiança do mercado de tecnologia até que conseguiram emplacar o primeiro projeto e, com ele, o primeiro aporte financeiro. “Lá no início, ao apresentarmos o plano de negócios para os investidores, a pergunta que mais ouvíamos era: “Quem mais está fazendo isso?”, “Quem vocês estão copiando?”. Quando dizíamos que estávamos criando um mercado com uma tecnologia proprietária, o interesse desaparecia. Mas, a cada reunião que tínhamos, aumentava nossa certeza de que empreender era o nosso caminho. Que tínhamos uma tecnologia poderosa na mão.”

Já consolidada, a In Loco provê soluções para grandes aplicativos de diversos segmentos como alimentação, mobilidade, entregas, varejo, vendas entre consumidores, fazendo a conexão entre o Online to Offline (O2O). Entre os clientes da startup pernambucana estão Santander, TIM, Banco Original, e o Magalu (site do Magazine Luiza). Esse grupo, inclusive, só tende a aumentar. Em tempos de debate para a implementação da Lei Geral de Proteção de Dados, que entra em vigor no segundo semestre de 2020, uma empresa de tecnologia que explorada dados e defende o direito à privacidade dos usuários de tecnologia só tende a prosperar.

In Loco provê soluções para grandes aplicativos de diversos segmentos como alimentação, mobilidade, entregas, varejo, entre outros. Foto: divulgação

Ainda jovem, mas com o já demonstrado potencial de crescimento, a In Loco já planeja um futuro com inovações de um mercado que muda rapidamente. Os próximos passos já começaram a ser dados: foi fundada a Incognia, empresa “irmã” da In Loco, mas com sede em Nova York (EUA), focada em usar a localização no combate a fraudes.

Revolução na tecnologia da segurança

Outra empresa pernambucana de tecnologia da informação que pensa em revolucionar é a Avantia, fundada por Silvio Aragão, atual CEO da organização — que já participou do Memória do Futuro, entrevistando Cláudio Marinho. Criada em 1998, hoje a organização é focada em tecnologia da segurança e infra de TI, mas iniciou seus negócios como a Aragão Engenharia, empreendimento especializado em instalações elétricas. 

A Avantia foi fundada por Silvio Aragão, atual CEO da organização. Foto: divulgação

Com o tempo, novas expertises foram surgindo, assim como novos integrantes que agregaram conhecimentos de diferentes áreas: Hamilton Valentim, primeiro sócio de Silvio, entrou quando a iniciativa ainda tinha um ano. Uma década depois de fundada, a empresa passou a se chamar Avantia e ganhou um novo sócio, Eduardo Ferreira Lima. Hoje, a organização é considerada uma das cinco maiores empresas da área de tecnologia da segurança do País:

“Nós queremos reinventar o modelo de segurança na América Latina. A partir da Inteligência Artificial podemos extrair muito mais informação nessa área das imagens e áudios”, diz Sílvio aragão sobre planos a longo prazo da Avantia.

Para chegar ao futuro buscado, a Avantia tem investido no presente com criações como o Avantia Labs, núcleo instalado no Porto Digital, em que 25 engenheiros de tecnologia empenhados em investir em tecnologias própria da empresa.

Além do investimento em software com o selo Avantia, a organização tem buscado capilaridade no mercado nacional e internacional. Há cinco anos inaugurou uma filial em São Paulo e agora a unidade ganhou um novo escritório de dois andares com 900 m², capaz de abrigar os times comercial e marketing, além de disponibilizar um showroom com as principais soluções oferecidas de forma integrada. Além disso, ampliou seu quadro de funcionários em cerca de 17%, totalizando 426 colaboradores. Para Aragão, São Paulo é um mercado que precisa ser ocupado mais cedo nas estratégias das empresas pernambucanas, especialmente as que vendem para outras empresas: “Se eu soubesse que seria tão proveitoso para a empresa ter uma filial em São Paulo, já tinha iniciado esse processo há mais tempo. Temos muito a conquistar o mercado do Sudeste e para 2020 já planejamos realizar negócios na América Latina”.

O monitoramento por vídeo realizado pela Secretaria de Defesa  Social de Pernambuco e do metrô do Recife têm assinatura da Avantia. Foto: divulgação

Em Pernambuco, no entanto, os serviços da Avantia já fazem parte do nosso cotidiano, e nem todos percebem. Para se ter ideia, o monitoramento por vídeo realizado pela Secretaria de Defesa  Social do Estado e do metrô do Recife tê assinatura da empresa. Além da área de segurança física, o sistema inteligente de monitoramento da marca está presente no varejo, indústria, instituições financeiras, empresas de logística, hospitalar, Data Center e outras. Entre os clientes da companhia estão: a Celpe, Fiat, Complexo de Suape, Coca Cola, Alcoa, Walmart, Ambev e muitas outras corporações.

Mobilidade é um negócio lucrativo

Outra empresa de tecnologia da informação que nasceu em Pernambuco, alcançou sucesso e está mais presente na rotina da pessoas é a Serttel. Criada em 1988 quando seu atual presidente, Ângelo Leite ainda era universitário, a organização fazia pequenos serviços voltados, principalmente, para os telefones públicos da época, como pequenas manutenções. Pouco tempo depois de criada, a Serttel deixava de atuar no ramos das telecomunicações e investia na montagem de aparelhos de semáforo. Com o produto sendo bem aceito nas ruas de diversas cidades, surge a necessidade dos serviços de manutenção, quase como um pós-venda.

“Hoje temos muitos projetos, mas só posso planejar crescimentos, até mesmo de faturamento, após a passagem da crise econômica do País”, diz Ângelo Leite sobre futuro de Serttel.

O negócio vai se fortalecendo até que em meados de 1997, a empresa já havia investido em equipamentos de fiscalização de trânsito, o que se assemelha com as lombadas eletrônicas atuais. “Nessa época a enter atuava em três ramos: montagem de semáforos, serviços de manutenção e instalação de fiscalização eletrônica. Mas um grande salto foi em 2001, quando passamos a operar o GIT (gerenciador inteligente de trânsito). Foi então que nós unimos de vez o hardware com sistemas”, relembrou Ângelo Leite, presidente da Serttel.

Ângelo Leite viu no setor de mobilidade urbana um caminho promissor para empreender. Foto: Facebook Serttel

A evolução da empresa era rápida. Entre 2003 e 2008 a organização já havia iniciado projetos como sistema de estacionamento público em São Paulo, o Zona Azul digital e plataformas piloto de compartilhamento de bicicletas. Já em 2011, após tentativas frustradas para as bikes compartilhadas, o banco Itaú propôs uma parceria que viria a modificar o modelo e fazê-lo entrar de dez na rotina das pessoas. Tamanho sucesso fez o negócio de compartilhamento de bikes representar 25% do faturamento da Serttel. 

Entre 2013 e 2014 a empresa esteve no seu auge, tendo mais de 3 mil funcionários espalhados em escritórios pelo País. No entanto, a crise econômica que se instalou no Brasil a partir de 2015 fez a corporação enfrentar sérias dificuldades. Um ano depois, o projeto era vendido para a Tembici, que hoje administra as bikes compartilhadas fornecidas pelo Itaú. Ângelo conta que a empresa estava endividada e os contratos eram com entes públicos ou empreiteiras que passaram a ter problemas com a Justiça, sem fazer os pagamentos devidos. “Quando vendemos o projeto, usamos o dinheiro para reequilibrar as contas”, contou Ângelo Leite.

Buscando retomar os negócios de fiscalização de trânsito, a Serttel firma uma parceria com o Google entre 2017 e 2018. Atualmente, a empresa tem se voltado às plataformas digitais que operam em diversas cidades brasileiras com soluções envolvendo mobilidade urbana. Com os pés no chão e foco em objetivos a longo prazo, hoje a empresa conta com um faturamento anual que gira em torno de  R$ 100 milhões.

Passar a operar o GIT (gerenciador inteligente de trânsito) foi a principal mudança da chave nos negócios da Serttel. Foto: Facebook Serttel

Hoje, contando com uma linha completa de soluções tecnológicas para Gerenciamento de Trânsito, Segurança e Mobilidade Urbana, a Serttel tem se destacado como uma das mais importantes empresas do setor. Ela atua nas principais regiões metropolitanas do Brasil, como nos estados de São Paulo, onde possui uma fábrica. Fora do País, a organização está presente na Argentina, México e Equador.

Além disso, com mais de 30 anos de caminhada, a Serttel se transformou em um grupo, pois uma outra empresa, Mobilicidade, faz parte do seu corpo administrativo. Com cerca de 800 funcionários, como engenheiros, designers e programadores de software, a empresa ainda conta com unidades de criação no Parque Tecnológico de Eletroeletrônica de Pernambuco (Parqtel) e no Polo Tecnológico do Porto Digital. 

Meta é nunca abrir mão da inovação

Mesmo já contando com décadas de atuação e tendo enfrentado dificuldades pelo caminho da tecnologia, essas empresas buscam se manter modernas, com a “pegada” de startup, inovando sempre. Esse é um dos desafios assumidos por outra gigante pernambucana da tecnologia da informação: a Neurotech. Com quase 20 anos de estrada, a empresa oferece soluções inteligentes para conectar dados, fazer análises de riscos e tentar prever o futuro dos consumidores, oferecendo segurança financeira a instituições como bancos e seguradoras.

Domingos Monteiro, cofundador e CEO da Neurotech acredita que o ramo de análise crédito e soluções financeiras ainda tem muito a oferecer. Foto: divulgação

Esta também é uma empresa que está mais presente na rotina diária das pessoas do que elas mesmas imaginam. Solicitar um cartão de crédito, conquistar linhas de crédito, fazer o seguro do seu carro, entre outras ações financeiras que dependem de análise se crédito, é o tipo de negócio da Neurotech. Em 2019, a organização bateu a meta dos R$ 50 milhões de faturamento, que deverá chegar a cerca de R$ 70 milhões em 2020. 

“Para se ter ideia, 30% do nosso faturamento vem de iniciativas que desenvolvemos nos últimos dois anos” revela Domingos Monteiro, cofundador e CEO da Neurotech.

Monteiro conta que a empresa começou junto com o processo de fundação do CESAR – centro de pesquisa e inovação embarcado no Porto Digital. “Eu estava concluindo meu mestrado e acabei direcionando os estudos para um problema apresentado pelo CESAR, que, na época, tinha essa função de levar problemas corriqueiros para serem resolvidos dentro da universidade. Éramos três pesquisadores, eu e mais dois professores. Em 2000 fomos considerados uma unidade de negócios do CESAR. A Neurotech não tinha nem CNPJ, o que só chegou no final de 2002”, relembrou.

No entanto, para chegar a este patamar Domingos Monteiro disse que enfrentou alguns tropeços. “Começamos fazendo a análise de risco para o cartão de crédito Hipercard através da inteligência artificial. Depois que deu certo, também tínhamos alguns cliente locais do ramo do varejo. Foi quando tentamos ir para o mercado financeiro e falhamos. Nesse momento decidimos voltar para o setor do varejo e repensar nossas estratégias”, contou Monteiro.

A organização presta serviço para mais de 50 instituições financeiras, além de clientes da área do varejo. Foto: Facebook Neurotech

Esse recuo foi determinante para o fortalecimento da empresa que hoje conta com sede no Recife e filial em São Paulo. Antes rejeitada pelos bancos, agora a organização presta serviço para mais de 50 instituições financeiras, além de clientes da área do varejo. Entre os contratantes da Neurotech estão a Votorantim, Marisa, Renner, Bradesco Saúde. 

Para com esse crescimento, a Neurotech tem investido em inovação, mas não pensa, por ora, em se expandir para o mercado internacional. “Ainda temos muito mercado para conquistar aqui no Brasil. Além disso,temos sempre que investir em novos em novos produtos, como uma plataforma que temos para seguros. Agimos como uma startup que sempre se renova. Para se ter ideia, 30% do nosso faturamento vem de iniciativas que desenvolvemos nos últimos dois anos”, finalizou Domingos Monteiro.

Sites das empresas citadas: 

Procenge – www.procenge.com.br

In loco – www.inloco.com.br

Avantia – www.grupoavantia.com.br

Serttel – www.serttel.com.br

Neurotech – www.neurotech.com.br

Cesar – www.cesar.org.br

 

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